Romulo e Remo: O Mito que Fundou Roma
- Sidney Klock
- 18 de abr.
- 2 min de leitura
Roma não nasceu de pedra. Nasceu de sangue, abandono e sobrevivência. Foi parida por uma loba e alimentada por uma lenda que atravessou milênios. No coração do mito que fundou um dos maiores impérios da história, pulsa a história de dois irmãos, Rômulo e Remo — gêmeos destinados à glória e ao fratricídio. Antes de existirem templos, legiões e senadores, havia um berço improvisado às margens do Tibre e uma loba faminta que, em vez de devorar, amamentou.

A origem desse mito remonta à Roma arcaica, mas foi moldada politicamente ao longo dos séculos. De acordo com a tradição, os irmãos eram filhos de Reia Sílvia, uma vestal estuprada por Marte, o deus da guerra. O nascimento de Rômulo e Remo desafiava o trono de Alba Longa, governado por Amúlio, que mandou afogá-los. Mas o destino, guiado por correntes divinas, os levou ao colo da loba Luperca. Criados por pastores, eles cresceram fortes, impetuosos, e ao descobrir sua linhagem real, tomaram vingança contra o usurpador.
A fundação de Roma por Rômulo em 753 a.C. foi, paradoxalmente, um ato de destruição: ao delimitar os muros sagrados da nova cidade, Rômulo matou Remo, que os havia atravessado em desafio. O fratricídio ecoou como um presságio sombrio — Roma, grande e gloriosa, nasceria do sangue de seu próprio irmão. Esse gesto, ao mesmo tempo bárbaro e simbólico, foi interpretado por historiadores como Tito Lívio e Plutarco não apenas como uma tragédia pessoal, mas como a alegoria da escolha entre ordem e caos, lei e liberdade.
Ao longo dos séculos, o mito foi instrumentalizado por imperadores como Augusto, que se apresentou como novo Rômulo ao refundar Roma moral e espiritualmente. O símbolo da loba, nutridora de uma civilização feroz, passou a representar a própria essência da cidade: uma força selvagem domesticada pela missão de governar o mundo. O mito fundacional não é apenas um relato sobre o passado, mas uma lente através da qual Roma se enxergou eternamente — destinada, desde a infância, a dominar o tempo e o espaço.
Em um mundo que ainda busca narrativas identitárias para legitimar poder, o mito de Rômulo e Remo nos revela a função política da memória. Ele mostra como mitos podem ser mais duráveis que pedras e mais influentes que exércitos. Ainda hoje, a loba Capitolina está estampada em brasões, moedas e monumentos, lembrando-nos que a história muitas vezes nasce não da verdade, mas da crença partilhada em uma boa história.
❗Curiosidade
Uma das estátuas mais famosas da loba Capitolina — aquela que amamenta os gêmeos — por muito tempo foi atribuída à Antiguidade. Mas estudos modernos revelaram que a escultura da loba pode ter sido feita apenas na Idade Média. Os gêmeos? Esses sim foram acrescentados no século XV.
🔍 Referências
Tito Lívio, Ab Urbe Condita
Plutarco, Vidas Paralelas – Rômulo
Universidade de Cambridge, The Cambridge Ancient History
Museu Capitolino de Roma
G. Dumézil, Mitologia e Ideologia entre os Indo-Europeus
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