O Dia da Empregada Doméstica e a memória silenciosa que sustenta lares
- Sidney Klock
- 28 de nov.
- 3 min de leitura
Entre as atividades que moldam o ritmo dos lares, existem gestos que atravessam o tempo como fios persistentes. O Dia da Empregada Doméstica se inscreve nesse território discreto onde o cotidiano se revela memória e presença, formando um espaço em que o cuidado e a permanência se entrelaçam. A história dessa data abre uma janela para compreender as camadas profundas de um ofício que ajudou a sustentar famílias, cidades e modos de viver.

A origem do Dia da Empregada Doméstica e o legado de Santa Zita
A celebração nasce em torno da figura de Santa Zita, reconhecida na Itália do século XIII como referência de dedicação ao trabalho doméstico. Seu nome atravessou séculos e fronteiras até se tornar símbolo de proteção às trabalhadoras que cuidam dos lares. Essa tradição europeia chegou à América Latina e ao Brasil, onde encontrou terreno fértil numa sociedade em transformação urbana.A história de Santa Zita dialoga com temas já explorados em nosso arquivo, como a permanência simbólica do cotidiano e a força da memória em figuras que atravessam séculos, assunto que também abordamos em reflexões sobre ritos e hábitos como guardiões do tempo dentro do projeto Eco Informativo.
A consolidação no Brasil e a lenta construção de direitos
No Brasil, o reconhecimento formal do trabalho doméstico começou a ganhar forma apenas no século XX. A urbanização das décadas de 1930 e 1940 modificou a estrutura das cidades e ampliou o número de trabalhadores dedicados às tarefas dos lares. Ainda assim, a categoria permaneceu por longo período sem as proteções presentes em outras atividades profissionais.A primeira legislação específica surgiu em 1972, seguida por avanços importantes na Constituição de 1988. O marco decisivo ocorreu em 2013, quando a Emenda Constitucional que ampliou direitos às trabalhadoras domésticas foi aprovada, garantindo jornada regulamentada e benefícios sociais antes inacessíveis. Esse processo se articula com outros movimentos de reconhecimento histórico já tratados em nossos textos sobre formação social brasileira e dinâmicas do trabalho ao longo dos séculos, criando pontos de contato dentro da própria Sala de Leitura.
Memória e invisibilidade social ao longo dos séculos
A herança da escravidão marcou profundamente a forma como o trabalho doméstico se estruturou no país. Por séculos, essas funções estiveram associadas a relações hierárquicas e à ausência de mobilidade. A lenta transição para vínculos assalariados manteve resquícios simbólicos e sociais que ainda hoje são percebidos na forma como esse ofício é valorizado.Revisitar essa trajetória permite observar como o cuidado exercido dentro das casas participa da formação da memória coletiva, tema que também aparece em nossos artigos dedicados às relações entre história e identidade cultural.
O trabalho doméstico como gesto que molda culturas
O cuidado cotidiano deixa marcas. A presença de quem organiza, limpa, prepara e acompanha atravessa infâncias, consolida vínculos e molda gerações. O trabalho doméstico, muitas vezes visto apenas como função prática, é também espaço de transmissão de hábitos, de ética e de convivência.Ao reconhecer esse campo silencioso, desenha-se a possibilidade de enxergar a casa como território histórico, onde vidas se cruzam e memórias se acumulam em camadas, como páginas discretas de um arquivo vivo.
Caminhos futuros e a busca por dignidade
Projetos sociais, grupos de pesquisa e movimentos trabalhistas vêm ampliando o espaço de escuta e reconhecimento destinados às trabalhadoras domésticas. A história dessa data se estende até o presente como convite a imaginar novos modos de respeito e igualdade.O 27 de abril se torna, assim, não apenas lembrança, mas horizonte, lembrando que a construção de dignidade é sempre processo em andamento.
Curiosidade
Durante o período colonial brasileiro, grande parte das tarefas domésticas era exercida por pessoas escravizadas dentro das casas urbanas e rurais. Esses arranjos moldaram práticas, expressões e percepções que ainda repercutem na cultura do trabalho doméstico no país.
Referências
• Brasil, Constituição Federal de 1988
• Lei Complementar nº 150, de 2015
• Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, estudos sobre trabalho doméstico
• Domingos, José, Trabalho Doméstico no Brasil, História e Conquistas
• ONU Mulheres, Relatório sobre trabalho doméstico e direitos humanos



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