top of page

Dia do Cinema Brasileiro, A História Fascinante da Sétima Arte no Brasil, de 1898 ao Presente

  • Foto do escritor: Sidney Klock
    Sidney Klock
  • 28 de nov.
  • 4 min de leitura

O Brasil inteiro cabe dentro de uma tela escura. Quando as luzes se apagam e o feixe luminoso encontra a superfície branca, projeções de barro, água e gente dançante ganham forma — como se o próprio país se lembrasse de sonhar. Celebrar o Dia do Cinema Brasileiro, em 19 de junho, é acender novamente esse projetor íntimo que nos conecta às origens, à esperança e às metamorfoses da nossa identidade.


Homem brasileiro do século XIX filma a Baía de Guanabara do convés de um navio com uma câmera antiga, sob luz suave da manhã, com névoa sobre a água e o contorno do Rio de Janeiro ao fundo. Cena com atmosfera nostálgica e estilo artístico clássico.
Arte: SK

A centelha na Baía de Guanabara (1898)


Em 19 de junho de 1898, o italiano radicado no Rio de Janeiro Afonso Segreto ergueu sua câmera no convés do navio Brèsil e registrou as águas da Guanabara. Aqueles breves segundos — hoje desaparecidos — são considerados o primeiro filme rodado em solo nacional. O gesto transformou a data em símbolo de nascimento do nosso cinema.

Dois anos antes, em julho de 1896, os cariocas haviam testemunhado a primeira exibição “cinematographica” no país, encantados pelos inventos dos irmãos Lumière.

Mesmo que nenhuma das imagens pioneiras tenha sobrevivido, a fagulha criativa de Segreto ecoa em cada fotograma brasileiro desde então. A história começara com um marinheiro-cineasta, o mar e a vontade de eternizar o instante.


Primeiros passos e a era das chanchadas (1900-1950)


Nos anos 1910 e 1920, Peixoto, Gonzaga, Humberto Mauro e Adhemar Gonzaga exploraram paisagens mineiras, fluminenses e baianas. A produção era itinerante, quase artesanal. Mas foi na década de 1930 que o país descobriu sua veia popular: as chanchadas — comédias musicais alinhadas ao rádio e ao samba — lotavam cinemas, celebrando o riso num Brasil urbano em ebulição.

A chanchada, hoje por alguns vista como “ingênua”, foi revolucionária: falava a língua das ruas, formava público fiel e, sobretudo, ensinava a indústria a dialogar com o prazer do espectador. Cada gargalhada iluminava o caminho para o próximo rolo de filme.


Cinema Novo: a câmera-caneta (1950-1970)


“Uma ideia na cabeça e uma câmera na mão.” O lema de Nelson Pereira dos Santos, Glauber Rocha, Cacá Diegues e outros jovens insurgentes moldou o Cinema Novo, movimento que abraçou a estética da fome, a poesia bruta e uma crítica existencial à desigualdade. Filmes como Rio, 40 Graus (1955) ou Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) deslocaram o centro do imaginário: o sertão, o morro, a utopia e o fracasso tornaram-se protagonistas.

Enquanto a modernização acelerava, essas obras revelavam contradições profundas. Mas, acima de tudo, provaram que o cinema brasileiro podia ser pensamento, manifesto e arte universal sem perder seu sotaque.


Crise, Embrafilme e silêncio (1970-1990)


Na segunda metade dos anos 1970, a estatal Embrafilme garantiu produção e distribuição, embalando sucessos como Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976). Contudo, a década de 1980 trouxe inflação, videoclubes e queda de bilheteria. Com a extinção da Embrafilme em 1990, as câmeras quase emudeceram. Algumas salas exibiam um único filme nacional por ano: era o inverno de celuloide.


Retomada e Lei do Audiovisual (1993-2000)


Em 1993, a Lei do Audiovisual reconfigurou financiamentos via incentivos fiscais; em 2001 nascia a ANCINE. Surge então a chamada Retomada: Carlota Joaquina (1995), O Quatrilho (1995) e Central do Brasil (1998) reconquistam público e prêmios, devolvendo ao país a confiança na própria imagem.

A Retomada foi mais que ressurgimento financeiro: foi catarse coletiva. Num espelho recém-polido, o brasileiro via-se plural outra vez — criança e idoso, sertanejo e cosmopolita, esperança e contradição.


Anos 2000: diversidade, favela, poesia urbana


Com tecnologia digital e coproduções, a produção atingiu números inéditos. De Cidade de Deus (2002) — frenético mosaico sobre violência e sonho — a Tropa de Elite (2007), passando pelo humor de O Auto da Compadecida (2000), novas linguagens alcançaram festivais mundiais e milhões de espectadores.

A câmera agora circulava por becos, condomínios, estradas amazônicas, quilombos e clubes de periferia. Cada filme ampliava o vocabulário do Brasil filmado.


A consagração internacional recente: Bacurau e além


Em 2019, Bacurau, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, venceu o Prêmio do Júri em Cannes, perfazendo o feito mais alto desde O Pagador de Promessas (Palme d’Or, 1962). A mistura de realismo sertanejo e ficção científica crítica mostrou-se universal e ao mesmo tempo profundamente local.

No mesmo período, produções como Aquarius, Que Horas Ela Volta? e Marte Um trouxeram discussões sobre memória, trabalho doméstico, negritude e futuro — confirmando a vocação do cinema brasileiro para abraçar temas vastos com lente sensível.


O presente híbrido: streaming, coletivos e novas vozes


Hoje, plataformas digitais democratizam o acesso, enquanto editais regionais fomentam narrativas LGBTQIA+, indígenas e afro-centradas. Se a sala escura enfrenta desafios, o cinema expande-se para celulares, praças e redes. A experiência não se restringe mais ao assento estofado; é onipresente: lives, mostras online, cineclubes de garagem.

A palavra-chave é pluralidade. Cada realization — seja blockbuster de ação no Nordeste, seja curta experimental filmado em quilombo amazônico — compõe um mosaico que reflete a complexidade contemporânea.


Como no primeiro mergulho de Segreto na Guanabara, o cinema brasileiro continua navegando entre neblinas, inventando portos. É arte que contesta, consola, documenta e imagina. Ao celebrar 19 de junho, recordamos que a história projetada na tela é, em essência, história de nós mesmos: luminosa, contraditória e viva, feito vaga que nunca cessa de se reinventar.


Curiosidade


Pouca gente sabe que o Brasil possui dois “dias” dedicados ao cinema: além de 19 de junho (data da primeira filmagem), existe 5 de novembro, lembrando a primeira exibição paga no país em 1896. Um marco para quem prefere comemorar duas vezes a mesma paixão!


Referências


  1. Brasil Escola – “19 de Junho — Dia do Cinema Brasileiro” brasilescola.uol.com.br

  2. O Globo – “Conheça a história por trás da data…” oglobo.globo.com

  3. Agência Brasil – “História Hoje: 19 de junho é o Dia do Cinema Brasileiro” agenciabrasil.ebc.com.br

  4. Toda Matéria – “História do Cinema Brasileiro” todamateria.com.br

  5. Brasil Escola – “Cinema brasileiro: surgimento, principais produções” brasilescola.uol.com.br

  6. AICinema – “A História do Cinema Brasileiro” aicinema.com.br

  7. Cinestésico – “Retomada: o renascimento do Cinema Brasileiro” cinestesico.com

  8. UFMG – “Cinema brasileiro da Retomada” fafich.ufmg.br

  9. Revista USP – “Fomento ao Cinema Brasileiro: o papel do Estado” revistas.usp.br

  10. Agência Brasil – “Bacurau ganha prêmio no Festival de Cannes” agenciabrasil.ebc.com.br

 
 
 

Comentários


bottom of page