O Dia em que um Milhão e Meio Gritou por Liberdade e o Apogeu das Diretas Já em São Paulo
- Sidney Klock
- 25 de nov.
- 2 min de leitura
Em 16 de abril de 1984, o Brasil parou para ouvir a voz de um povo cansado da mudez imposta pela ditadura militar. Um milhão e quinhentas mil pessoas se aglomeraram no Vale do Anhangabaú, no coração de São Paulo, para reivindicar um direito essencial: votar diretamente para presidente. Foi a maior manifestação popular já registrada no país até então, um eco histórico de resistência que marcou o ápice da campanha das Diretas Já. Mais que números, aquele mar humano era um símbolo vivo da sede de democracia.

A mobilização havia ganhado força desde o final de 1983, com comícios em várias capitais brasileiras, mas foi em São Paulo que ela alcançou seu clímax. A manifestação foi liderada por figuras de peso como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Leonel Brizola, Lula e Fernando Henrique Cardoso. Também contou com a participação ativa de artistas, intelectuais e movimentos sociais. Mais do que uma reunião de partidos ou ideologias, o comício foi a confluência da sociedade civil que havia despertado do medo e exigia sua voz de volta.
Esse momento não surgiu do nada. Ele foi gestado em anos de repressão, censura e violações dos direitos civis. Desde o Ato Institucional nº 5, em 1968, até o fim da década de 70, o Brasil mergulhou num estado de exceção. No entanto, a luta persistiu em sindicatos, universidades, jornais clandestinos e nos corações que não se renderam. O Anhangabaú não foi apenas palco de um evento: tornou-se altar de uma nação em reconstrução. As Diretas Já reuniram a indignação coletiva e a transformaram em um gesto de esperança.
Ainda que a emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas, não tenha sido aprovada, o impacto das Diretas Já foi irreversível. Em poucos meses, o regime militar ruía por dentro. A pressão popular influenciou diretamente a eleição indireta de Tancredo Neves e abriu o caminho para a redemocratização do país. O Brasil despertava para uma nova era onde a vontade popular voltava a ser protagonista da história. O comício de 16 de abril ficou eternizado como um grito uníssono de dignidade.
Hoje, esse evento ecoa nas manifestações contemporâneas, nas redes sociais e nas urnas. É um lembrete de que o direito ao voto não é apenas um mecanismo formal, mas uma conquista coletiva e contínua. Em tempos de ameaças à democracia, lembrar o Anhangabaú é lembrar que nenhuma conquista é permanente sem vigilância e participação. A multidão de 1984 continua a nos chamar, não ao passado, mas à responsabilidade com o futuro.
Curiosidade
Durante o comício das Diretas Já, os alto-falantes usados no Vale do Anhangabaú eram tão potentes que foram emprestados de grandes shows musicais, e a acústica foi calculada por engenheiros de som que já haviam trabalhado com artistas como Milton Nascimento e Elis Regina.
Referências
CPDOC FGV — Diretas Já
Fundação Perseu Abramo — A trajetória das Diretas Já
Câmara dos Deputados — A Emenda Dante de Oliveira



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