Capitulações de Santa Fé: o contrato que deu início à conquista da América
- Sidney Klock
- 17 de abr.
- 3 min de leitura
Em 17 de abril de 1492, em Santa Fé, próximo a Granada, os Reis Católicos da Espanha assinaram com Cristóvão Colombo um documento que mudaria para sempre o curso da história mundial: as Capitulações de Santa Fé. O tratado garantia a Colombo os títulos de "Almirante do Mar Oceano", "Vice-rei" e "Governador das terras descobertas", além de uma parcela considerável dos lucros obtidos. Era a oficialização de uma aposta ousada – financiar uma rota ocidental para as Índias –, no exato momento em que o poder espanhol acabava de consolidar-se com a reconquista de Granada, último reduto muçulmano na Península Ibérica. A união entre fervor religioso, ambição territorial e desejo de expansão econômica moldava ali um novo ciclo global.

As Capitulações não foram apenas um contrato de exploração: eram uma carta branca para o início de um projeto imperial. Colombo, um navegador genovês de ideias obstinadas, encontrara em Isabel e Fernando os patronos certos. Eles buscavam fortalecer a identidade espanhola recém unificada e ampliar sua influência além-mar, em um cenário geopolítico onde Portugal já acumulava experiências marítimas no Atlântico Sul. Ao outorgar poder quase monárquico a Colombo, os reis davam início não só à viagem que culminaria na chegada à América, mas também à era das conquistas coloniais, com todas as suas consequências culturais, econômicas e humanitárias.
É essencial compreender que as Capitulações foram também um ato de propaganda e autoridade. A assinatura em Santa Fé, onde os monarcas estavam acampados após a vitória contra os mouros, trazia um simbolismo claro: a evangelização e a “civilização” de novos territórios seriam uma extensão natural da luta contra o Islã. Este não era apenas um projeto de navegação, mas a projeção de um império cristão global. O documento original, hoje perdido (só sobreviveram cópias), se tornaria a base jurídica para justificar conquistas, subjugações e, posteriormente, a doutrina do “domínio legítimo” europeu sobre as Américas.
O resultado dessa decisão foi avassalador. Meses depois, Colombo chegaria às Antilhas acreditando estar nas Índias, e o mundo conhecido se expandiria de maneira dramática. Os efeitos do tratado ecoariam por séculos: no surgimento de novas nações, na dizimação de povos originários, na troca de culturas, doenças e riquezas entre os continentes – o chamado intercâmbio colombino. O contrato de 1492 foi, portanto, o prenúncio de um novo mundo, com promessas de glória e horror entrelaçadas.
Hoje, ao olharmos para as Capitulações de Santa Fé, enxergamos não apenas o início de uma viagem, mas o nascimento simbólico da globalização moderna. O mundo nunca mais seria o mesmo após aquela assinatura. Debruçar-se sobre esse episódio é essencial para compreender as complexidades da colonização e suas heranças, muitas vezes contraditórias, ainda presentes na cultura, na geopolítica e na memória coletiva dos povos das Américas.
🔎 Curiosidade
Você sabia que Cristóvão Colombo quase desistiu do projeto antes da assinatura das Capitulações? Ele já havia sido rejeitado por Portugal, Inglaterra e França. Isabel de Castela só aprovou a missão após uma intervenção do tesoureiro real, Luis de Santángel, que garantiu o financiamento inicial com recursos próprios, convencendo a rainha de que o risco valia a glória.
📚 Referências
Instituto Cervantes – Biblioteca Digital
Biblioteca Nacional de España
Real Academia de la Historia (RAH)
“1492: O ano do mundo novo”, de Felipe Fernández-Armesto
“A Conquista da América”, de Tzvetan Todorov
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